Luciano Huck foi assaltado. Levaram seu Rolex. Quem se importa? - você pode se perguntar, como eu. Mas acredite, virou capa da revista Época e páginas amarelas da revista Veja. Eu não li a matéria nem a entrevista; mas tive que ler o artigo que o apresentador da Globo publicou na Folha de São Paulo e a crônica do rapper e escritor Ferréz, autor de Capão Pecado, sobre essa "negociação da realidade", também publicada na Folha.
Eis a negociação da realidade: arma apontada contra a cara, o playboy da vez entrega o Rolex. Sem hesitar. O mano de capacete, armado, "tá na correria". "Se reagir, vira pó" - como diz o Mano Brown, outro trovador do Capão Redondo. Todo mundo sabe.
Eu tenho uma visão bem pouco ortodoxa dos crimes contra o patrimônio. Diferentemente do tráfico de drogas, que é uma transação econômica que envolve fluxo bilateral de bens e renda entre os atores dessa "negociação da realidade", o traficante e o comprador, e obedece a mecanismos de oferta e demanda, em crimes contra o patrimônio, como furto, roubo e assalto, o fluxo de bens e renda entre o criminoso e a vítima é unilateral. Não há qualquer troca de bens econômicos. Substitui-se a posse de algo pela ausência de posse, dialeticamente.
É a lei da bala, simbólica e contundente. O "você sabe com quem está falando?" do mano que aponta uma "quadrada" ou um "três-oitão" e aproxima dois Brasis: o Brasil que não tem e o Brasil que tem. Mas não da mesma forma como também aproxima o Brasil dos "otários", como eu, mão-de-obra barata, e o Brasil dos patrões, abastados.
Eu sei que não passo de um "otário" que enriquece o patrão, empresário. Em relação a ele, meus campos de possibilidades são cerceados pelo mercado de trabalho na contemporaneidade. Se eu não quiser mais, tem uma fila de candidatos ao meu emprego. Como preciso do meu emprego, sigo "otário".
Afinal, quem não tem, quer ter. Quem tem, é vítima em potencial de quem não tem, mas quer ter a qualquer preço. É assim com "correria". Como um Robin Hood às avessas que toma de quem tem para si. O "correria" é um Robin Hood aventureiro, híbrido do homem cordial (de Sérgio Buarque de Hollanda) e do caos urbano à brasileira. Sem arco e flexa nem estudo, mas "com ferro na cinta", esse Robin Hood à brasileira é o anti-herói nacional contemporâneo.
Aposto que o "correria" que roubou o Rolex do Luciano Huck roubou apenas mais um. Outro dia, outra "fita", outro playboy. Não fosse apresentador global, Luciano Huck não teria nem registrado boletim de ocorrência na delegacia.
Eis a negociação da realidade: arma apontada contra a cara, o playboy da vez entrega o Rolex. Sem hesitar. O mano de capacete, armado, "tá na correria". "Se reagir, vira pó" - como diz o Mano Brown, outro trovador do Capão Redondo. Todo mundo sabe.
Eu tenho uma visão bem pouco ortodoxa dos crimes contra o patrimônio. Diferentemente do tráfico de drogas, que é uma transação econômica que envolve fluxo bilateral de bens e renda entre os atores dessa "negociação da realidade", o traficante e o comprador, e obedece a mecanismos de oferta e demanda, em crimes contra o patrimônio, como furto, roubo e assalto, o fluxo de bens e renda entre o criminoso e a vítima é unilateral. Não há qualquer troca de bens econômicos. Substitui-se a posse de algo pela ausência de posse, dialeticamente.
É a lei da bala, simbólica e contundente. O "você sabe com quem está falando?" do mano que aponta uma "quadrada" ou um "três-oitão" e aproxima dois Brasis: o Brasil que não tem e o Brasil que tem. Mas não da mesma forma como também aproxima o Brasil dos "otários", como eu, mão-de-obra barata, e o Brasil dos patrões, abastados.
Eu sei que não passo de um "otário" que enriquece o patrão, empresário. Em relação a ele, meus campos de possibilidades são cerceados pelo mercado de trabalho na contemporaneidade. Se eu não quiser mais, tem uma fila de candidatos ao meu emprego. Como preciso do meu emprego, sigo "otário".
Afinal, quem não tem, quer ter. Quem tem, é vítima em potencial de quem não tem, mas quer ter a qualquer preço. É assim com "correria". Como um Robin Hood às avessas que toma de quem tem para si. O "correria" é um Robin Hood aventureiro, híbrido do homem cordial (de Sérgio Buarque de Hollanda) e do caos urbano à brasileira. Sem arco e flexa nem estudo, mas "com ferro na cinta", esse Robin Hood à brasileira é o anti-herói nacional contemporâneo.
Aposto que o "correria" que roubou o Rolex do Luciano Huck roubou apenas mais um. Outro dia, outra "fita", outro playboy. Não fosse apresentador global, Luciano Huck não teria nem registrado boletim de ocorrência na delegacia.