Se alguém pergunta por que eu corro, respondo: pela inconstância. Correr subverte a noção de espaço-tempo. Encurta as distâncias. Aproxima as pessoas e os lugares.
Correr é mudar de estado. Algumas verdades se liquefazem. Escorrem. E algumas certezas se dissipam com o atrito entre meu corpo e o resto das forças que sustentam o Universo.
Ao começar a correr, sinto logo meus órgãos se reposicionando, ajustando-se, qualquer que seja meu pace inicial. É quando a máquina começa a reagir...
Não preciso conhecer meus músculos pelos respectivos nomes para senti-los. Não preciso saber que tecidos compõem minhas articulações para ouvi-las em ação. Não preciso de muito: só de mim mesmo.
Quando corro, sei que minha alma também verte uma espécie de choro ancestral, inspirado em registros proteicos de antigas cadeias helicoidais que chegaram até aqui. Um legado milenar: correr é fugir; fugir é não morrer, macaco!
E essa certeza líquida me permite sentir que, enquanto mais chão fica para trás, meu corpo continua vivo.
Isso me basta...