domingo, 25 de fevereiro de 2007

Eremias Delizoicov (2)

Acabei de devorar o livro "Náufrago da Utopia", do jornalista Celso Lungaretti. Lungaretti militava no movimento estudantil secundarista no final da década de 1960. Com o recrudescimento da repressão contra a mobilização popular que reagiu contra o autoritarismo da Ditadura, em 1968, ele adere à luta armada. Ingressa na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) com outros secundaristas, dentre eles seu velho amigo Eremias.

Eu sou absolutamente passional e bem pouco meditativo. Quem me conhece, sabe. Desde ontem de manhã, tenho crises de choro lendo o livro ou pensando na leitura.

Por algum mecanismo psi cujo funcionamento desconheço por inteiro, reconheço-me em Eremias. Talvez porque, na adolescência, sentia-me inútil em um mundo onde mais valia o que você tinha, e não quem você era; e que hoje, aos 28 anos, me deprime, mutila meu sorriso. Aos 17 anos, depois de ler "Meu Amigo Che", sentia que deveria ter nascido numa época onde o ideal (cristão?) de se oferecer como cordeiro ao sacrifício por uma causa maior fazia sentido para alguns, e sobrepunha-se ao ideal consumista dos adolescentes do meu tempo, que completam 18 anos como um rito de passagem para a aquisição da CNH e de um automóvel comprado pelos pais.

Sempre fui tido como líder negativo no Ensino Médio. Presidente do Grêmio Estudantil do Centro Educacional Setor Oeste, em Brasília, tentei destituir a Direção da escola com a publicação de um órgão informativo, redigido por mim e pago pela presidente da Associação de Pais e Mestres, também professora de Biologia, que reproduziu sem ler o conteúdo, e deu um tiro no próprio pé. Eu tinha 17 anos à época, e me senti como teria me sentido ao expropriar qualquer bem material por um ideal revolucionário...

Mas aquela "minha guerrinha de faz-de-conta" soçobrou. Sozinho, subia no banco e gritava mais alto do que todos. Quase fui linchado pelos alunos do 3º ano. O ano letivo acabou. Eu entreguei a prova de recuperação de Química em branco. Meu sacrifício aos 17 anos: imolei meu ano letivo de 1995.

A morte de Eremias, ocorrida em 1969, há quase 38 anos, quase uma década antes do meu nascimento, hoje alimenta meu ódio e faz meu estômago doer. E torna pífia e sem sentido minha luta de adolescente "engajado".

Eremias (Celso Lungaretti)

Era mau aluno,
treinava judô.
Sorriso moleque,
morreu em pedaços,
35 balaços.

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